
Por Rosa Estrada
Eu me considero uma pessoa de esquerda, mas às vezes sou assaltada por pensamentos um tanto quanto niilistas. Tenho pensado bastante sobre o segundo turno das eleições presidenciais. No embate Dilma x Serra, salta aos olhos o fato de que se trata de uma disputa sobre qual dos dois é mais fascista. E pior, é no que for considerado mais fascista que o povo vai votar, em sua maioria. Em relação à polêmica das correntes de internet segundo as quais Dilma seria a favor da legalização do aborto, da união civil entre homossexuais e sei lá mais o que, me impressiona que esses tais boatos seriam para os eleitores motivos para não se votar na candidata petista. Agora eu pergunto: se Dilma legalizasse o aborto ou deixasse viado se casar, isso iria afetar em que a sociedade brasileira? Em nada, creio eu. No entanto, causa no povão um horror comparável ao holocausto somente a possibilidade de Dilma estar a fim de empreender qualquer uma dessas medidas progressistas às quais ela está sendo acusada de ser afeita. E Serra se aproveita da polêmica, aproveitando para ressaltar o quanto se coloca em "defesa da vida" e se diz abertamente contra o aborto, supondo com isso estar agradando o passional eleitorado. Não satisfeito, ainda veicula uma propaganda ridícula, para dizer o mínimo, com umas mulheres grávidas acariciando suas volumosas barrigas ao som de dizeres do tipo "o maior milagre da vida é gerar uma vida" e outras baboseiras fascistóides do gênero. Na mesma propaganda, a coligação de Serra ainda promete inaugurar uma política chamada Mãe Brasileira, na qual as parturientes recebem enxoval assim que o bebê nasce. Fiquei com vontade de arrancar o útero ao ver e escutar tantos disparates. Porra, quer dizer então que a mulher só veio ao mundo pra parir?! E quanto ao planejamento familiar e à legalização do aborto? Eu, como mulher, cidadã e explorada pelo sistema, exijo ter o direito de fazer sexo o quanto quiser sem o risco de engravidar. Exijo acesso gratuito a camisinha e outros métodos anticoncepcionais, e reivindico inclusive a possibilidade de fazer um aborto em condições dignas, caso os métodos falhem. Não admito que o Serra, o Malafaia ou o Papa me ponham cinto de castidade, nem que eu seja obrigada a parir se eu por acaso engravidar.
Fico impressionada também com a credulidade do povo. Acreditar em teoria de conspiração de internet?! Não vou nem comentar a baixeza dessa estratégia desesperada da coligação pró-Serra. Só queria deixar aqui o meu alerta para os partidos de esquerda. Seja como for, o povo está suscetível a assimilar todo tipo de informação. Porém, só a direita se aproveita disso para disseminar teorias da conspiração de cunho fascista, no que aliás tem sido muito bem sucedida. Às vezes eu tenho a impressão de que só a direita milita. As classes dominantes continuarão conseguindo nos impor sua visão de mundo e nos convencem de que as necessidades das elites são as necessidades de todos. Infelizmente os pobres no Brasil não têm consciência de classe, não se reconhecem como classe explorada. O pobre sempre acha que é mais remediado que o vizinho. O pobre é convencido de que sua vida não é tão ruim assim. O pobre acha certo quando a polícia dizima jovens pretos e periféricos e acredita quando o jornal diz que as vítimas tinham envolvimento no tráfico. Enfim, o pobre tem a ilusão de que é igual ao burguês, de que o que beneficia o burguês o beneficia também, que um governo para empresários é um governo que pode favorecê-lo. Se os partidos de esquerda finalmente penetrassem nas massas, as organizassem, e mostrassem o quanto as mesmas são exploradas e o quanto é necessário o fim do capitalismo, finalmente vislumbrar a mudança. Senão, os comunistas continuarão sendo vistos como bandidos e inimigos do povo.