Um Blog de dois erres, para todos os errantes.

sábado, 9 de outubro de 2010

Em defesa da vida?



Por Rosa Estrada

Eu me considero uma pessoa de esquerda, mas às vezes sou assaltada por pensamentos um tanto quanto niilistas. Tenho pensado bastante sobre o segundo turno das eleições presidenciais. No embate Dilma x Serra, salta aos olhos o fato de que se trata de uma disputa sobre qual dos dois é mais fascista. E pior, é no que for considerado mais fascista que o povo vai votar, em sua maioria. Em relação à polêmica das correntes de internet segundo as quais Dilma seria a favor da legalização do aborto, da união civil entre homossexuais e sei lá mais o que, me impressiona que esses tais boatos seriam para os eleitores motivos para não se votar na candidata petista. Agora eu pergunto: se Dilma legalizasse o aborto ou deixasse viado se casar, isso iria afetar em que a sociedade brasileira? Em nada, creio eu. No entanto, causa no povão um horror comparável ao holocausto somente a possibilidade de Dilma estar a fim de empreender qualquer uma dessas medidas progressistas às quais ela está sendo acusada de ser afeita. E Serra se aproveita da polêmica, aproveitando para ressaltar o quanto se coloca em "defesa da vida" e se diz abertamente contra o aborto, supondo com isso estar agradando o passional eleitorado. Não satisfeito, ainda veicula uma propaganda ridícula, para dizer o mínimo, com umas mulheres grávidas acariciando suas volumosas barrigas ao som de dizeres do tipo "o maior milagre da vida é gerar uma vida" e outras baboseiras fascistóides do gênero. Na mesma propaganda, a coligação de Serra ainda promete inaugurar uma política chamada Mãe Brasileira, na qual as parturientes recebem enxoval assim que o bebê nasce. Fiquei com vontade de arrancar o útero ao ver e escutar tantos disparates. Porra, quer dizer então que a mulher só veio ao mundo pra parir?! E quanto ao planejamento familiar e à legalização do aborto? Eu, como mulher, cidadã e explorada pelo sistema, exijo ter o direito de fazer sexo o quanto quiser sem o risco de engravidar. Exijo acesso gratuito a camisinha e outros métodos anticoncepcionais, e reivindico inclusive a possibilidade de fazer um aborto em condições dignas, caso os métodos falhem. Não admito que o Serra, o Malafaia ou o Papa me ponham cinto de castidade, nem que eu seja obrigada a parir se eu por acaso engravidar.
Fico impressionada também com a credulidade do povo. Acreditar em teoria de conspiração de internet?! Não vou nem comentar a baixeza dessa estratégia desesperada da coligação pró-Serra. Só queria deixar aqui o meu alerta para os partidos de esquerda. Seja como for, o povo está suscetível a assimilar todo tipo de informação. Porém, só a direita se aproveita disso para disseminar teorias da conspiração de cunho fascista, no que aliás tem sido muito bem sucedida. Às vezes eu tenho a impressão de que só a direita milita. As classes dominantes continuarão conseguindo nos impor sua visão de mundo e nos convencem de que as necessidades das elites são as necessidades de todos. Infelizmente os pobres no Brasil não têm consciência de classe, não se reconhecem como classe explorada. O pobre sempre acha que é mais remediado que o vizinho. O pobre é convencido de que sua vida não é tão ruim assim. O pobre acha certo quando a polícia dizima jovens pretos e periféricos e acredita quando o jornal diz que as vítimas tinham envolvimento no tráfico. Enfim, o pobre tem a ilusão de que é igual ao burguês, de que o que beneficia o burguês o beneficia também, que um governo para empresários é um governo que pode favorecê-lo. Se os partidos de esquerda finalmente penetrassem nas massas, as organizassem, e mostrassem o quanto as mesmas são exploradas e o quanto é necessário o fim do capitalismo, finalmente vislumbrar a mudança. Senão, os comunistas continuarão sendo vistos como bandidos e inimigos do povo.